A capacidade criativa da humanidade me deixa bastante admirado. Várias coisas também me incomodam de um tanto… Dizem por exemplo que o que nos distingue dos outros animais é a capacidade de iluminarmos a nós mesmos (e eu digo habilidade e não capacidade porque existe uma grande parcela da população que não sabe nem trocar uma lâmpada). Aí estava há pouco vendo a minha cachorra tomar água, nesse calor dantesco… Besteira esse papo de luz: talvez a nossa diferença quanto aos outros animais é a nossa habilidade muito esperta de saber fazer água gelada. É a coisa mais barata e esperta que existe. Você coloca água lá naquela caixona, espera um tempo e voilá, gelo. Mas não vim falar de luz nem de gelo hoje. Vim falar de outra expressão da criatividade humana bastante curiosa, o futebol.
Deus sabe, aliás, Obatalá sabe o quanto eu não gosto de futebol. Simplesmente eu não vejo sentido nem nesta atividade extenuante de 22 pessoas correndo e – detalhe, correndo atrás de uma bola – nem na parte ritualística da coisa de 1.503.654.876.345.765.125.457.987 torcedores vibrando por um dos times neste planeta e em toda galáxia. É, tinha me esquecido, existem os times. Através de uma intrincada operação matemática, você divide estes 22 jogadores em dois lados e coloca um pano de cores diferentes em cada. Aí os jogadores de um time têm que correr bastante com a bola no pé (óbvio, senão ele seria um velocista) para acertar a referida bola dentro de um retângulo do lado oposto do campo, retângulo bastante grande, eu diria. E ficam assim, por 90 minutos correm de um lado pro outro tentando tomar a bola do time adversário e, olha que fantástico, com os pés (é, isso é curioso, porque falam tanto de “polegares opositores” nos seres humanos e nessa história de futebol eles têm que fazer isso com os pés, eis a habilidade)!
Ontem assisti aquele jogo da seleção brasileira contra a Colômbia. É assim mesmo, cada país tem inúmeros jogadores de futebol jogando em vários times, aí escolhem os melhores de cada time e compõem uma “seleção nacional”, evidentemente, os seres humanos mais habilidosos daquele país a correr de um lado pro outro com uma bola nos pés. E nas Copas do Mundo ou nestes embates internacionais nós temos a honra de assistir aos melhores seres humanos do mundo mais habilidosos em correr de um lado pro outro com uma bola nos pés. Profissionais. Isso desde 1863, quando os ingleses inventaram o futebol…
O jogo de ontem deu em nada, evidentemente, nos mostrando que a seleção brasileira, a mais famosa e vencedora seleção nacional do planeta Terra é, como era de se esperar, como qualquer outro time do mundo inteiro: normal. É claro que esta expressão irrita e muito os brasileiros e, é claro, a imprensa. A imprensa que aposta todas as suas fichas narrando a maior tragédia da humanidade com os mercados financeiros em desespero fica doida quando vê a seleção brasileira perder: “foi um resultado frustrante, decepcionante!” Deveriam completar: “Foi um resultado frustrante, decepcionante… ver os mais habilidosos seres humanos [da espécie humana!] que andam quilômetros com as bolas nos pés não conseguirem acertar aquela bolinha num retângulo de mais de 7 metros em 90 minutos…
E se dizem profissionais. Isso, estes seres humanos especiais, espécimes ímpares e superiores de todo o caldo genético humano são remunerados para acertar aquela bola num retângulo de mais de 7 metros lá do outro lado do campo enquanto “profissionais”. Aí penso eu, se em 90 minutos eles não acertam nem a trave, imagina os “amadores” então… Para fazerem um gol nessa lógica uma partida deveria durar um mês!
Outro detalhe que me divirto muito e acho ainda mais curioso é o tal de “cavar a falta” no futebol contemporâneo. O cara treina (e só alguns treinam, afinal, já que são os melhores da espécie humana em correr de um lado pro outro com uma bola pela graça divina, ops, “genética”, por quê treinar?) por horas e horas por dia para conseguir acertar aquela bolinha num retângulo de 7 metros e pouco, aí chega no momento da partida, é um craque: com a bola nos pés ele dança, pula, brinca, dá chapéu, dá bule, dribla todos os jogadores adversários (e em alguns casos os do próprio time… eis o “fominha”), chega na área adversária sozinho e vai chutar e é gooo… opa, gol nada – ele caiu, por algum curto interstício mágico de tempo ele tropeça num palito de fósforo imaginário e cai e se estrepa todo… “Pênalti” gritam, gritam todos, torcedores, jogadores, técnico (exceto, é claro, o time adversário).
Aí penso eu que a história de “cavar falta” é uma “involução” do futebol no mundo OU, pior ainda, a espécie humana está se degradando. Afinal, desde 1863 se pensa na seguinte regra básica “meu, toma essa bola e sai correndo feito um lunático pro outro lado do campo com ela nos pés, aí quando ver o retangulão, chuta!”. E o jogador não chuta, ele cai. É, cai, assim, caiu feito um pato morto. E ainda dizem os comentaristas de futebol que é tática, estratégia… Estou tentando entender onde é que está essa estratégia ridícula de tropeçar na frente do gol… Se fosse numa guerra sangrenta, esses caras iriam fazer o quê? Chegar no front e tropeçar no chão feito barata tonta à espera da piedade do inimigo? É, me parece que não faz muito sentido.
É, estou sendo muito cruel, muito maldoso. Mas tenho algumas mensagens de consolo, se é que servirão para alguma coisa. Primeiramente, a todos os que gostam de futebol – em especial os brasileiros e a sua seleção brasileira, não desanimem. Sempre no fim do ano zera tudo: você pode ter 1583 taças na sala de prêmios do clube, no entanto, todos sabem que a quantidade de troféus não interfere em nada no campeonato seguinte, ou seja, ânimo! E minha segunda mensagem, maldosa, porém realista, é a seguinte: desconsiderando os jogadores que simplesmente “caem” na área adversária, todos os demais, se largarem mão da bola, podem entrar pra equipe de atletismo do país, olha que bonito. Quem sabe aí ganhamos mais medalhas nas próximas olimpíadas?
Victor Hugo
Maldoso, cruel, dolorido. Adorei!
Muitíssimo obrigado. Vou falar a verdade: você foi a única pessoa que leu este artigo e teve coragem para deixar um comentário. Conheço várias pessoas que leram e vieram me dizer no MSN ou pessoalmente as críticas (a maioria delas ferrenhas…), mas nenhuma teve coragem de escrever aqui, rs. Portanto, você acabou de quebrar um antigo tabu aqui do Ao Sugo!
Abraços,
Ok, esqueci o óbvio, inteligente.
E depois de assistir a essa copa, eu leio esse post aqui e simplesmente não consigo não rir da maneira sádica e hilariante da forma de ver o futebol hahahaha
Ficou simplesmente ótimo!