Ter herdado aquela vasta propriedade foi causa de ruína em minha família. Várias gerações passaram investigando os mistérios da mansão e seus arredores, muitos delas gozando de uma fortuna repentina oriunda dos subterrâneos daquela região. O primeiro deles chegou nestas terras na virada do século XIX para o século XX, tendo descoberto algum segredo na residência recém-comprada por míseros 20.500 vinténs, algo bastante suspeito, porém tido como um lance de sorte pelos meus antepassados.
Os anos seguintes foram marcados pelo crescimento da riqueza e mortes súbitas de todos os patriarcas da família. Todos pereceram de causas misteriosas, porém, podres de ricos. Hoje recai a mim os cuidados da propriedade, sabendo que logo mais também sofrerei de algum infortúnio desmedido. Poderia desistir das riquezas do subsolo, contudo, acorrentado na maldição desta família, devo continuar procurando pelos segredos desta terra. Que eu tenha mais sorte e possa viver um pouco mais…
Ah, tudo isso é mentira. Mas não para The Darkest Dungeon, Roleplaying game lançado em janeiro de 2016 de teor lovecraftiano. Para quem curte uma história como a introdução deste artigo, bastante à lá O Caso de Charles Dexter Ward de H.P. Lovecraft, eis um prato cheio. Se ainda curte o estilo de Mike Mignola ao desenhar Hellboy, melhor ainda.
Mal comecei o jogo e já recomendo fortemente para todos aqueles que curtem um RPGzinho básico e descomprom… bom, The Darkest Dungeon é tudo mesmo descompromissado. O jogo possui todos os elementos que tornam os ERPGs memoráveis, como a criação de um grupo de aventureiros, cada um com sua particularidade, para resolver missões em uma masmorra assombrada. É muito importante o trabalho em equipe e a divisão de tarefas e ataques para o sucesso da aventura, algo oriundo dos RPGs “de mesa” com seus sistemas de classes e tudo mais.
Em The Darkest Dungeon o jogador precisa ficar atento para algumas variáveis que afetam o jogo a todo o momento, como o medo, o pânico e o estresse. É necessário um cuidado meticuloso sobre o management dos personagens, além de ser imprescindível prestar muita atenção na elaboração do grupo de aventura: um grupo desbalanceado pode levar a missão ao fracasso, este quase sempre escabroso.
O nível de dificuldade é de médio a alto, até que é comum você perder vários personagens ao longo da campanha. Não se assuste se o cemitério começar a ficar bastante visitado por aqueles campeões que você julgava serem muito bons em batalha: como um livro do George R.R. Martin, é meio complicado você se aferrar a um ou outro personagem no início do jogo, pois não só as baixas estatísticas de jogo, como também a inexperiência do jogador, acaba levando nossos heróis à morte por uma série de razões. Acabou a comida, acabaram as tochas, os antídotos… o nível de estresse aumenta e, quando você menos espera, um personagem entra em pânico e compromete toda a aventura.
O sistema de combate de The Darkest Dungeon é em turnos, o que acabou funcionando. Existe um quê de nostalgia ao jogar o jogo, com uma estética e uma narração que deixam o jogador imerso nesta atmosfera sombria. The Darkest Dungeon é bastante soturno e tudo, desde as narrações até os tijolos das paredes mostram um povo assombrado e sem esperanças. Parece que um mal caiu por estas terras e tudo está por um fio.
O ponto alto do jogo é, mais uma vez, a arte, que lembra bastante os quadrinhos do Hellboy, sem contar a narrativa que é totalmente inspirada nos contos de H.P. Lovecraft. Se você está procurando um jogo com temática lovecraftiana e uma arte fantástica, esse é para você. Confesso que quando foi lançado, não tinha grandes expectativas, porém, foi a estética e a inspiração que me pegaram. Acabei assistindo uma partida no Twitch e foi o suficiente para comprar a cópia digital segundos depois.
Vale a pena para quem curte uma história de terror, mas estejam avisados: o jogo é bem difícil. Todas as imagens colocadas neste texto foram retiradas de algumas partidas minhas (apanhando horrores), para que vocês tenham uma ideia real de The Darkest Dungeon. Cuidado e caminhem pela sombra.
Victor Hugo Kebbe, apavorado