Se você foi criança na década de oitenta, espera-se que não tenha passado batido por uma infinidade de coisas que ajudaram a construir o imaginário coletivo de toda uma geração. Em 1983, seria desenvolvida uma animação que retumbou nos costumes de uma legião de crianças em vários locais do mundo. O enredo envolvia um bando de humanoides felinos, personagens criados pelo norte-americano Ted “Tobin” Wolf, cada caracterizado de acordo com uma raça diferente, e sua luta contra um mal ancestral. Thundercats foi uma ideia do estúdio estadunidense Rankin/Bass Productions, mas a animação em si foi produzida pelo grupo de estúdios japoneses chamado Pacific Animation Corporation. A Lorimar-Telepictures ficou a cargo da distribuição do desenho. A propósito, um dos estúdios que faziam parte da Pacific era o Topcraft, que mais tarde veio a se tornar o renomado Studio Ghibli, do gênio da animação japonesa, Hayao Miyazaki.
A premissa era bem simples: membros de uma raça humanoide e felina fogem de seu mundo à beira da destruição, Thundera, em naves com cápsulas de estase (para que não envelhecessem demais durante a viagem). Entre os principais sobreviventes estava o jovem filho do Rei Claudis e príncipe dos Thundercats, Lion, cuja cápsula estava com defeito e, mesmo partindo como criança, já se mostra adulto aos companheiros quando chegam ao misterioso Terceiro Mundo. Ele assume a famigerada Espada Justiceira e torna-se líder dos Thundercats. Embora demonstre, em não poucas vezes, considerável ingenuidade, Lion é auxiliado por seus sagazes companheiros e pelo espírito de Jaga, o verdadeiro mestre da Espada Justiceira e senhor da filosofia de Thundera. Entretanto, não era só o Lion que fazia o desenho, apesar dele ser o protagonista. O grupo multicolor de heróis que constituía os Thundercats incluía representantes de diversas raças felinas.
A primeira temporada de Thundercats chegou em 1985, dois anos após o início de seu desenvolvimento. Essa primeira temporada tinha 65 episódios (bastante longa, pode-se dizer). Um longa-metragem foi lançado em 1986, chamado Thundercats – HO!. Também em 1986 que a animação começaria a ser exibida no Brasil, pela Rede Globo. Os próximos anos dariam cabo da produção das temporadas seguintes, que foram padronizadas em cerca de 20 episódios cada; às vezes um episódio tinha mais de uma parte, como Retorno a Thundera, que possuía cinco capítulos. A segunda temporada foi produzida em 1987/88, a terceira em 1988/89 e a quarta em 1989/90.
No total, criou-se 130 episódios. Contudo, não foram todos exibidos pela nossa querida Rede Globo, que nunca passou do centésimo capítulo, Ilha do Exílio. Depois de um hiato de cinco anos, Thundercats voltaria à programação global em 1995, com a extinta TV Colosso, um bloco matutino muito divertido destinado ao público infantil. Nessa mesma época, tanto a Warner Channel quanto o Cartoon Network passaram a também exibir o seriado, mas logo a ideia morreu. Foi então que, em 2001, Silvio Santos e seu SBT disponibilizariam o desenho no programa Bom Dia & Cia, apresentado por Jackeline Petkovic, que veio do Fantasia. O Homem do Baú ainda viria a exibir todos os episódios do desenho.
Bem, não podemos falar de Thundercats e simplesmente esquecer que, em 1985, a Marvel Comics começou a produzir uma HQ das aventuras dos felinos. Já que toquei nisso, vale dizer que a HQ, para quem teve chance de conhecer, sempre foi um tanto mais refinada, mais “adulta”, digamos assim, e por que não, violenta. Essa HQ foi publicada até 1988, e nada mais seria feito até 2003, vejam só, quando a Wildstorm Productions, fundada por Jim Lee, adquiriu a licença para a publicação de uma nova série em quadrinhos, ainda melhor que antes. A Wildstorm hoje é um selo da DC Comics, e as revistas continuam a ser publicadas, junto com alguns outros licenciados, como Resident Evil e Speed Racer.
No Brasil, isso tudo vem sob a asa da Panini, que felizmente emplacou numa qualidade excelente e formato americano. Recentemente a editora lançou uma várias edições das novas séries, uma mais bonita que a outra. As histórias em quadrinhos dos Thundercats de hoje são batalhas épicas e temas adultos, o que é excelente: a ideia amadureceu junto com seus fãs, porque mesmo que o sentimento de nostalgia ainda esteja nos desenhos, as HQs trazem novo respiro a algo antigo, e novas aventuras e personagens mais desenvolvidos em relação aos mais inocentes que ajudaram a construir o nosso caráter.
Mas não era só de Lion que os Thundercats eram formados. Tinha o Panthro, o mais velho, um gênio mecânico e artista marcial, quem inventou o Thundertank. Tygra era o segundo em comando dos Thundercats, ágil, calmo e racional; ele quem projetou a Toca dos Gatos. Cheetara usava um maiozão vermelho e lutava com um seu bastão mágico, além de correr a velocidades absurdas. O casal de gêmeos Wilikat e Wilikit que só se metiam em enrascadas e o alívio cômico Snarf também faziam parte da trupe liderada por Lion.
Muito bem, quando essa galera chegou ao tal Terceiro Mundo (que muita gente discute ser, na verdade, a própria Terra) eles toparam com um cara totalmente refinado: uma múmia decrépita, Mumm-Ra, um mal encarnado, seria o grande inimigo dos Thundercats, que tentavam se estabilizar no novo planeta. Mumm-Ra tinha uma série de subordinados, os Mutantes, cujos expoentes são Escamoso, Chakal e Simiano. Esses caras também vieram de fora e chegaram antes de Lion e o pessoal todo, mas viraram a casaca para o Mumm-Ra e viraram seus servos.
Como se não bastasse, nosso amigo poderia invocar o poder dos Espíritos do Mal e se enchia de anabolizantes, ficava fortão e virava Mumm-Ra, o De Vida Eterna. Esse era a versão 2.0 Diplomata Turbo do Mumm-Ra, cheia de poderes e que realmente botava a galera para correr. Apesar de tudo, os Thundercats sempre davam um jeito de derrotar a versão motherfucker do Eterno, e acabava que ele precisava voltar para a sua pirâmide e seu sarcófago para descansar, curar-se ou qualquer outra coisa que um ser eterno deve fazer em sua pirâmide. Quando a gente assistia o desenho quando criança, era muito comum pensar “Ah, mas que desgraçado esse Mumm-Ra”, né?
Pois agora para algo completamente diferente:
Se você der uma olhadinha no Código Civil, mais especificamente na Seção I do Capítulo II do Título III do Livro III, encontrará o Art. 1.238, que diz: “Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.
Parágrafo único: O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo. (…)“
Foi aí que começamos a pensar: o Mumm-Ra está no diacho do Terceiro Mundo já há milênio, daí de repente chega um bando de jovens e começam a esculhambar com a casa dele, que acorda do sono de beleza e se põe a chutar bundas. Será que ele está realmente errado? Se levarmos em conta a besteirada conceitual de que “mal” é um ponto de vista então, aí danou-se. Imagina você levantar da sua cama, vai para a sala e tem um bicho cinza, careca, meio gato com um suspensório cheio de espeto e cueca roxa girando um nunchaku.
Se levarmos em conta a Lei da Usucapião, o Mumm-Ra é dono daquela bodega de Terceiro Mundo e não é de pouco tempo. Os Thundercats invadiram a casa de Mumm-Ra e saíram andando de thundertank por ali – Falando nisso, eu nunca tive o thundertank quando era criança; uma grande frustração, eu diria, porque eu achava aquilo realmente muito legal. E nem a Toca dos Gatos. Na verdade o único brinquedo que eu tinha dos Thundercats era uma Cheetara que eu e meus irmãos achamos na praia – Enquanto Mumm-Ra colocava os capangas dele para tentar expulsar Lion e sua turba dali, os Thundercats tentavam fazer a reforma agrária e transformar o Terceiro Mundo num local produtivo.
Enfim, não vamos aqui nos enveredar nos problemas sociais dos Thundercats. Há tribos de mulheres vivendo na mata, excluídos sociais por serem diferentes e mesmo um cara que cresceu dentro de uma nave, e sozinho (imaginem o que esse cara fazia naquela nave). No final das contas, o que basta lembrar dos Thundercats é o sentimento nostálgico ao ver cada antigo episódio, e ainda pelas HQs como o negócio se desenvolveu e evoluiu, curiosamente como aconteceu com os fãs. Um resvalo de tempos idos, contudo com a elegância de ter se transformado em algo não só para novos fãs, mas para os antigos também. Thundercats é tão valioso que não só foram (e são) narrativas de aventuras, como também podem até despertar a discussão social e sobre Direito Civil. No mais, deixem Mumm-Ra, o de Vida Eterna, em paz. Ele só quer dormir.
Marcus Vinicius Pilleggi
Tá chocado? Calma, ainda tem mais. Thundercats, Ho!
thunder-thunder-thundercats-HO!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
ótimo texto e mto esclarecedor tb… não sabia desse começo da história.. mto bomm!!!
Quem será o advogado de Mumm-ra?
olha só , Lion , o filho prodigio do rei Claudius , quem diria heim ? snaaaaarff
”Se levarmos em conta a besteirada conceitual de que “mal” é um ponto de vista então, aí danou-se. Imagina você levantar da sua cama, vai para a sala e tem um bicho cinza, careca, meio gato com um suspensório cheio de espeto e cueca roxa girando um nunchaku.”
Concordo , mas a múmia velha envocava os antigos espiritos do mal . Que além de espíritos , eram antigos e ainda maus . hahahahaahhahahhahha
Amigo, a lei do usocapião não se aplica a felinos intergaláticos, muito menos a múmias descrépitas do candomblé oriundos do Egito. Mas se fôssemos aplicar a tal lei, veríamos que os valentes felinos já teriam direito à caixa de areia, afinal estão há 26 anos no terceiro mundo subdesenvolvido.
Cara… qnta informação! sencacional! eu assitia direto e tinha alguns bonecos…. mas tb nao tive o thundertank…. nem a toca dos gatos… Mas óia…. mto bom… ja vo ler o proximo!!!!!
SNAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAARFFFFFFFFFFF
Só pra constar… em que tribunal ocorrerá o julgamento de invasão e perturbação da ordem causada pelo Lion e seus capangas?