No Country for Old Men – Parte 1

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A visão do jogador…

Ao contrário do que muita gente deve ter pensado logo de início, isso não é uma resenha do filme homônimo, embora o filme homônimo seja digno de uma resenha. Aliás, o que me traz a lembrança de como o nome pelo qual ele veio ao Brasil não tem nada que ver com o sentido original. Mas enfim… estou aqui para falar sobre um dos assuntos recorrentes no mundo nerd, mundo esse do qual eu e o Victor, orgulhosamente, fazemos parte. De novo, vamos conversar um pouco sobre o bom e velho RPG. E o melhor, do ponto de vista de um jogador convicto (embora, muitas vezes, mestre).

Comecemos com uma anedota: assim como meu co-administrador aqui do Ao Sugo, eu conheci e comecei com o RPG lá no começo dos anos 1990. Para ser mais exato, 1992. O Dungeons and Dragons, D&D, como muitos sabem, era recém-chegado nas terras-de-cá, e encontrar jogadores era tão difícil quanto encontrar os livros de regras que sustentam as aventuras. Naquela época, como já foi ressaltado em outros artigos do Ao Sugo, não existia, ao menos para nós, a internet nem mundo virtual, quanto menos downloads de livros escaneados em .pdf e afins. Para ter o negócio a gente tinha que, de fato, tê-lo. E não era uma coisa muito fácil de encontrar ou barata para comprar.

Muito bem, eu não vim aqui para repetir coisas sobre a história do RPG no Brasil e nem nada, mas sim conversar sobre um assunto incômodo e que é ressaltado em poucos lugares além do Ao Sugo, que são os tipos de jogadores de RPG. Mais especificamente, os jogadores antigos e os novos. Não, eu não vou formar alguns vários tipos de estereótipos ao decorrer do texto, mas eles inevitavelmente pipocarão.

A maior diferença entre os jogadores antigos e os novos, que poderíamos aí separar com o surgimento do Mundo das Trevas e da White Wolf (fundada nos EUA em 1991 por Mark Rein-Hagen e inaugurada com o lançamento do Vampiro: a Máscara), é que os jogadores antigos, fãs de fantasia medieval, Caverna do Dragão, Conan e Tolkien geraram, até por suas influências literárias, um espírito de cooperação que os jogadores posteriores raramente possuem.

A novidade da White Wolf com seu sistema, o Storyteller, era encantadoramente um tiro no pé, dependendo de quem jogasse. O primeiro problema é que, os jogos de Mark Rein-Hagen são, como dito nas capas, recomendados para maiores. Embora conceitualmente excelentes por explorarem aspectos psicológicos humanos, as publicações  não possuíam, em suas entrelinhas, a essência cooperativa que um jogo como D&D, por exemplo, exige (até porque as classes de D&D separadamente são, ou melhor, eram, inúteis). Por empreender excessivamente uma leitura da psique, a White Wolf produzia jogos que, em última instância, eram individualistas. Eu não vou entrar no mérito do sistema mecânico Storyteller que, mesmo sendo simples e bem visível e óbvio, é um dos piores e mais lentos sistemas de dados que eu já vi. Sem mencionar o fato de, quanto melhor você se torna, aumenta também a sua possibilidade de falhar. Vale lembrar que o foco da ambientação nunca foi esse, contudo.

Daí veio uma grande dificuldade. Os jogos da linha White Wolf se popularizaram em um público indevido: jogadores novatos e pessoas jovens. Não é incomum encontrar pseudo-nerds pirralhos jogadores de Vampiro: a Máscara ou Lobisomem: o Apocalipse. Jovens ou pré-adolescentes inconseqüentes cuja única contribuição imediata é estragar a graça de um jogo divertido, preocupando-se cada vez mais em se tornarem excessivamente poderosos para sobrepujar os companheiros de grupo. O problema é ligeiramente menor em Lobisomem, que apregoa coletividade e cooperação, mas em todos os representantes da White Wolf existe a primordial batalha individual do homem contra sua besta interior, tema psicológico importante e apresentado de forma figurativa em cada uma de suas principais publicações. A temática sombria pode ser, e muitas vezes é, brilhantemente explorada por mestres competentes e jogadores interessados e experientes. Nas mãos dos incautos, entretanto, torna-se uma virtude destrutiva. Afinal, a linha Storyteller possui jogos adultos.

Muitos desses pseudo-nerds cresceram e continuaram sendo pseudo-nerds e jogadores inconseqüentes. A maioria dos representantes das primeiras gerações de RPG no Brasil fez o caminho D&D/GURPS – AD&D (Advanced Dungeons and Dragons) – Storyteller e então se aventurou por suas novas versões, revisões e afins, o que garantiu um amadurecimento enquanto jogadores e pessoas. Vale lembrar, mais uma vez, os dizeres de todas as capas das principais publicações da White Wolf: recomendado para maiores. Os “jogadores novos”, contudo, muitas vezes fizeram o caminho contrário. Então, trouxeram para uma mesa de D&D ou GURPS, por exemplo, conceitos que eles aprenderam (ou melhor, acharam que aprenderam) na linha Storyteller ou outros e vícios que não condizem com a mesa “tradicional” de RPG. Teoricamente, um livro da White Wolf nem deveria ser vendido a menores para evitar esse tipo de coisa. Por conta de tais vícios, os novos jogadores têm dificuldade em assimilar conceitos simples como cooperação e a necessidade dos companheiros para o sucesso da campanha.

Não vamos pensar, todavia, que o D&D é isento de culpa ou que pintou um alvo na testa e entregou-se. Quando a TSR foi pro saco e a Wizards of Coast, nova dona do nome, lançou o Dungeons and Dragon: Third Edition, o Terceira Edição ou simplesmente 3.0 (trêspontozero), o mais famoso jogo de ambientação medieval ganhou novo respiro, mesmo entre os resistentes jogadores antigos, calcados no AD&D ou no GURPS. A premissa era muito interessante: uma releitura das antigas classes, maior possibilidade de criação, customização e liberdade, novos conceitos intraclasses, novas classes, um novo e simplificado sistema baseado no dado símbolo do D&D, o de vinte faces, d20, classes de prestígio… Era tudo muito bonito e elegante, talentos, perícias. O D&D 3.0 parecia ter chegado ao seu ápice. Nas mãos de jogadores mais experientes, as possibilidades eram quase infinitas, ou ao menos finitamente atrativas. Um jogo aparentemente caduco conseguiu até angariar novos fãs. Numa época em que novos jogadores de RPG eram, com dificuldade, arrancados dos mundos dos videogames, o sistema de jogo mais antigo conseguiu se renovar e trouxe sangue-novo.

Continua… [Leia agora]

Marcus Vinicius Pilleggi

Não deixe de continuar a leitura em No Country For Old Men – Parte 2 e No Country For Old Men – Parte Final

Como vocês já devem ter notado, somos bastante simpáticos ao mundo da fantasia, tendo dedicado inúmeros outros textos sobre este gênero. Para acessá-los, visite a nossa seção sobre Fantasia agora mesmo!

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