Quando não temos mais o que falar

james_dean

Há pouco apanhei uma revista aqui em casa que tinha como dizeres na reportagem de capa algo parecido com “Os jovens de hoje em dia estão perdidos”. Com certeza um título polêmico e digno de nota, instigando o leitor a, primeiro, comprar a publicação e, segundo, abrir na referenciada página para sabermos qual o mais novo pavor da sociedade moderna. E assim o fiz.

Cheguei numa reportagem que dizia exatamente isso: os jovens de hoje em dia, vítimas dos valores da sociedade moderna, estariam perdidos, vagando pelas ruas sem rumo, sem objetivos, sem metas, muito longe de um “Sentido da Vida”. Com novos recursos financeiros, tecnológicos e o aumento de opções propiciadas pelos dias de hoje estes jovens estariam “perdidos”, diferente das gerações passadas, estas engajadas de algum modo com o seu contexto, com a sua sociedade, tão diferente, idílica – idealizada – e bucólica repleta das mil maravilhas. Para provar este ponto a mesma reportagem apresentou algumas informações sobre os jovens das décadas anteriores frente aos jovens da sociedade moderna, com o único fim de comprovar pela Nossa Senhora da Santa Aquerupita que nós estamos numa nau sem leme rumo à perdição.

Destas informações vale ressaltar as referentes aos jovens da década de 1950 que tinham como um expoente o jovem James Dean com sua frase célebre “viva rápido, morra jovem e deixe um belo cadáver para trás”. Gostei. Gosto quando os órgãos da imprensa fazem isso, dão o tiro no próprio pé envoltos em contradições nebulosas. Para quem não sabe do que estou falando, ora,  basta lembrar como os jovens da década de 1950 eram vistos aqui e nos EUA, a tal juventude “transviada” que seria estereotipada nas figuras de Dean e Marlon Brando: então quer dizer que, em relação aos jovens do século XXI essa molecada da década de 1950, que nas palavras dos conservadores da época “pregavam a baderna”, “rebeldes sem causa que bebiam todas todos os dias”, eram muito mais conscientes e centrados do que os jovens de hoje? Sobre os Hippies então é melhor eu deixar quieto…

E aí entro com o título deste artigo que você está lendo. Acabou o assunto, morreu, finito, não sabemos o que dizer e pronto, dizemos (besteira), fugindo completamente das idéias “nobres” de jornalistas consagrados como Leão Pinto Serva ou mesmo o tal do “jornalismo compromissado” de Bernardo Kucinski e Eugênio Bucci, assunto que evidentemente o nosso caro Marcus poderia discorrer com mais propriedade. Por uma “necessidade mística” de alguma sorte somos bombardeados por uma incrível carga de informações – em sua maioria inúteis – como forma de manter a nossa sede para saber o que ocorre com a grama do vizinho, seja pelo jornalismo do espetáculo (e olha que caiu mais um avião, esse ano promete) ou, o mais divertido, pelo jornalismo sem sentido. Mas estaria sendo cruel se culpasse os jornalistas por um fenômeno mais generalizado, presente em todo canto, nos flyers de spas e clínicas estéticas, das caixas de sucos naturais industrializados (que paradoxo) aos documentários de canais por assinatura renomados: “precisamos falar sobre alguma coisa, seja o que for, afinal, alguém deve estar interessado”.

Não quero citar os principais pensadores da minha área de formação para tentar explicar esse fenômeno, acho mais divertido as pessoas – telespectadores, ouvintes e leitores – perceberem o sucesso e o fracasso do negócio. E para tanto, cito outro tiro no pé, tão mais divertido do que um James Dean muito mais centrado do que um pobre jovem dos dias de hoje: o caso dos dentes de Lucille Ball.

Em um conhecido programa da televisão paga em que dois investigadores procuram solucionar mistérios da ciência, nem a famosa comediante norte-americana das décadas de 40 e 50 em seu “I Love Lucy” escaparia da pauta do non-sense, se é que o non-sense tem pauta. Em uma antiga entrevista para a imprensa a comediante diria que, por conta de suas próteses e obturações dentárias, conseguia sintonizar estações de rádio com os dentes, dando razão para a mais justificada e meticulosa investigação do nosso programa televisivo contemporâneo: seria possível sintonizar ondas de rádio através de próteses dentárias?

E assim foi feito um enorme esforço técnico e científico para chegarem na decepcionante conclusão que não, não era possível, sendo apenas mais uma brincadeira da nossa infame comediante… Ora, vejam só, que piadista… Isso que a fez de Lucille Ball a eterna musa da comédia televisiva! E aí nos perguntamos, ok, onde está o bom-senso? Lógico que peço demais duma sociedade em que aparentemente tais valores dominantes reinam no mundo do non-sense, onde é questão vital procurar por informações sobre tudo e todos, impulsionados ainda mais pelas maravilhas tecnológicas como a internet. Com a internet a coisa fica até mais fácil, filie-se num serviço de feed ou RSS (ou Really Simple Syndication) de qualquer site que a informação chega até você, você querendo ou não.

E aqui termino este texto que expressa tanto a minha revolta sem causa à la James Dean quanto a minha perdição por infelizmente perfazer as estatísticas demográficas que me enquadram como um jovem, ou seja, em “situação de perigo” ou “vulnerabilidade” nesta sociedade cujos valores estão de cabeça para baixo (mote clássico que a gente escuta desde a virada do século XIX pro século XX). O que diria então o grupo de humoristas britânicos – o Monty Python – que décadas atrás (detalhe, eles eram jovens naquela época) zombaria descaradamente e sem pudor algum esta idealização absurda de “Sentido da Vida”? Pois digo que, apesar de todas as mudanças sociais que evidentemente marcaram a vida de todo mundo por estas bandas, se existe algo que diferencia os jovens de hoje dos jovens do passado é o acesso ao excesso de informação, em especial, às inúteis: com tamanha verborragia non-sense metralhada aos quatro cantos é no mínimo lógico pensar que estaríamos e só poderíamos estar perdidos. Fascinante, diria Spock.

Victor Hugo Dean, Rebelde sem Causa

Um comentário sobre “Quando não temos mais o que falar

  1. Antes de mais nada, preciso coemntar isso: O JAMES DEAN É/ERA LINDOOOOOO!!!
    Pronto, passou =D
    Agora falando sério… ja cantava a banda alemã Real Mccoy na decada de 90:
    Run away, run away, run away and save your life
    Run away, run away, run away if you want to survive
    It’s time to break free, oh oh oh oh, run away, oh oh oh oh
    You better break free, oh oh oh oh, run away, oh oh oh oh

    Money, sex in full control, a generation without soul
    Perfect people in a perfect world,
    Behind closed doors all in control
    Life, in a world of luxury,
    Cold cash money mentality
    You gotta keep the faith, you gotta keep the faith
    You’d better keep the faith and run away

    Money, sex in full control, look, big brother is watching you,
    Unlock your brain and save your soul,
    No more limits, no more curfew
    Life in the perfect system,
    Take a stand and fight for freedom
    Keep the faith, you gotta keep the faith
    You’d better keep the faith and run away

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